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Nova Andradina: “O preconceito das pessoas é o pior obstáculo”, diz família de autista

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Família conclama a sociedade a banir todo tipo de preconceito - Imagem: Acácio Gomes / Nova News

“O preconceito das pessoas é o pior obstáculo. A ignorância ou a falta de empatia de muita gente sobre o assunto é uma grande barreira que precisa ser vencida diariamente”, afirma a família de um garotinho autista de Nova Andradina.

Victor Gabriel Rosalvo da Conceição, de quatro anos, foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) aos três anos e dois meses. Ele é filho de Oscar da Conceição, de 34 anos, e Jéssica Aparecida Rosalvo da Silva, de 29 anos, que contaram ao Nova News um pouco sobre os desafios a serem superados diariamente.

“Uma época muito difícil para nós foi antes do diagnóstico. Perceber que ele era diferente das outras crianças e, ao mesmo tempo não saber ao certo o que estava acontecendo era muito angustiante”, revela Oscar, ao afirmar que os indícios principais surgiram na creche, quando se percebeu que Victor não interagia com as outras crianças, não participava de atividades em grupo. Ele ficava em um mundo só dele.

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Estímulos que Victor recebe na Equoterapia e na APAE têm feito a diferença na qualidade de vida da criança, afirmam os pais - Imagens: Arquivo / Família 

“Ele não aceita comandos. A gente fala com ele e ele nem liga. É como se a gente nem estivesse ali. No começo é muito difícil, pois o comportamento dele parece ser de indiferença, mas, com o tempo a gente aprende a perceber o amor, o carinho que ele tem e que são manifestados, geralmente, de outras formas”, detalha Jéssica.

“Depois daquela fase em que a gente percebeu que tinha algo diferente, veio o impacto do diagnóstico, quando a neurologista revelou que ele é autista, porém, uma vez sabendo disso, conseguimos contar com uma excelente rede de apoio e aí, quando as coisas começam a clarear a gente vai vendo que aos poucos o sol vai voltando a brilhar e a gente vai aprendendo a trabalhar tudo isso dentro de nós mesmos”, explica Jéssica.

Segundo o casal, o acompanhamento por especialistas, o atendimento de excelência ofertado diariamente pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) através da Escola de Educação Especial “Raio de Sol”, bem como a participação semanal na Equoterapia ofertada pelo 8º Batalhão da Polícia Militar (8º BPM), têm feito a diferença não apenas na vida do garotinho, mas de toda a família.

Segundo Oscar e Jéssica, Victor tem dificuldades de interação com outras pessoas; fala apenas duas ou três palavras, não conseguindo, portanto, formar frases; não suporta certos tipos de sons e ruídos, é bem seletivo com relação a alimentos e ainda faz uso de fraldas, mas, por outro lado é tem se tornado bastante ativo; tem excelente memória; se sai muito bem em atividades didáticas; é especialista em montagem de quebra-cabeças; ama animais e tem se mostrado carinhoso e solidário com os pais e também com outras crianças.

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Garotinho adora desenhar, montar quebra-cabeças e realizar atividades didáticas - Imagem: Acácio Gomes / Nova News

“O acompanhamento e os estímulos que ele tem recebido tanto na APAE quanto da Equoterapia, bem como o atendimento especializado com a medicação adequada tem feito toda a diferença na vida dele. Não neguem a seus filhos autistas esse direito”, pontuam.

O casal qualifica o preconceito e a desinformação sobre o tema como barreiras que afetam duplamente os autistas e suas famílias.

“Há quem veja o autista como uma criança birrenta, mal-educada e essas pessoas criam em suas cabeças a opinião de que os pais não sabem impor limites e não sabem criar o filho, o que não faz o menor sentido. Percebemos esse preconceito em muitos lugares que frequentamos, pelo olhar das pessoas e até mesmo pelas expressões de algumas delas. Dependendo da situação eu até informo as pessoas ao redor de que me filho é autista para que, sabendo disso, elas peguem leve em suas reações e evitem julgamentos”, diz o pai.

Segundo o casal, outro mal irreparável gerado pelo preconceito, muitas vezes, ocorre dentro do próprio grupo familiar do autista. “Conhecemos outras famílias de autistas que, por puro preconceito ou talvez vergonha, não procuram ajuda, não levam as crianças para receberem os devidos atendimentos e a atenção especial a qual elas têm direito e, com isso, estão negando aos seus filhos o direito e uma educação especial e de um desenvolvimento digno”, afirma a mãe.

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Observação no RG de Victor assegura direitos e reduz burocracia - Imagem: Acácio Gomes / Nova News

Além de oferecer ao filho todo o atendimento possível, outra providência adotada pelos pais foi providenciar a carteira de identidade de Victor. A cédula do Registro Geral (RG) traz a inscrição ‘Transtorno do Espectro Autista’. “Os autistas têm direitos especiais assegurados por lei a identidade com essa observação facilita a vida no dia a dia, pois dispensa a apresentação de laudos e torna certos atendimentos menos burocráticos”, afirma o casal.

Nas palavras de Oscar e Jéssica, combater o preconceito e a ignorância sobre o TEA é o principal obstáculo e ser vencido na sociedade. “Quanto mais as pessoas abrirem suas mentes e seus corações, mais os autistas e suas famílias se sentirão acolhidos na comunidade em que vivem. Não estamos falando de uma campanha, de uma semana ou de um mês no ano, mas de uma mobilização que deve ser constante, pois, apenas a informação, o conhecimento a respeito e principalmente o amor podem destruir a ignorância e extinguir o preconceito que só atrapalha e machuca”, conclui Oscar.

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Jéssica, Victor e Oscar esperam que a sociedade esteja cada vez mais aberta à compreensão e à aceitação - Imagem: Arquivo / Família

Fique por dentro*

A Conscientização do Autismo tem como objetivo esclarecer e propagar informações para a população sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Segundo a Organização Mundial da Saúde, essa condição afeta uma em cada 100 crianças no mundo. Mas a incidência do autismo ainda gera divergência e discussões entre as entidades que estudam a fundo o tema. Um recente levantamento do Center of Diseases Control and Prevention (CDC), dos Estados Unidos, mostra aumento na prevalência: uma em 36 crianças possui esse diagnóstico.

O TEA consiste em um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, alterações comportamentais, dificuldades na interação social, padrões de comportamentos repetitivos, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades e principalmente déficits na comunicação.

Segundo a coordenadora do Departamento de Foniatria da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF), Dra. Mônica Elisabeth Simons Guerra, o atraso da fala é uma das principais características que atingem as pessoas com Transtorno do Espectro Autista.

"As manifestações do autismo variam de pessoa para pessoa, mas os atrasos na fala e na comunicação social são comuns, podendo ser indicativos também de outros problemas, como distúrbios da audição, o que acaba levando à procura do médico otorrinolaringologista. Este é geralmente um dos primeiros sinais de alerta para o TEA, percebidos pela família", comenta.

Após a pandemia da Covid-19, a atenção dos pais a esses comportamentos é fundamental, pois a forma como as crianças interagem com outras pessoas mudou drasticamente devido às escolas fechadas e às restrições de distanciamento social, causando menos oportunidades de integração e aprendizagem, impactando no desenvolvimento da fala, principalmente naquelas que já estavam apresentando sinais de atraso.

De acordo com a Dra. Mônica, as crianças com atrasos de fala e linguagem também costumam ser vistas no segundo ano ou no início do terceiro ano de vida e elas parecem estar se desenvolvendo normalmente, "mas não falam ou pronunciam poucas palavras, não combinam palavras para formar frases, parece que não ouvem ou que não entendem as ordens ou, ainda, falam muito enrolado e os estranhos não conseguem compreender o que está sendo dito".

A ABORL-CCF reforça a importância da busca por um diagnóstico adequado para determinar a causa do atraso na fala e garantir que a criança receba o tratamento mais apropriado, o mais precocemente possível, identificando e avaliando, por exemplo, situações que comprometem o desenvolvimento de linguagem, como uma anomalia estrutural nos órgãos do sistema auditivo que pode impedir a audição, síndromes genéticas ou transtornos de desenvolvimento, como o TEA e o transtorno do desenvolvimento da linguagem.

Sinais de alerta

Segundo a médica foniatra, membro da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial e especialista da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica (ABOPe), Dra. Trissia Vassoler, alguns dos indícios apresentados por pessoas com TEA são olhar vago, não responder quando chamado pelo nome, não balbuciar ou emitir som a partir do terceiro mês, ausência de sorriso social e postura antecipatória para serem segurados quando um adulto se aproxima. A lista de sinais ainda inclui não falar nenhuma palavra com 12-14 meses nem mostrar interesse em se comunicar, não compartilhar interesses, falta de expressão de atenção conjunta, vocalizações incomuns e movimentos repetitivos com o corpo ou objetos, rigidez de comportamento, fixação em movimentos ou interesses e falta da brincadeira lúdica.

Diagnósticos precisos de crianças com atrasos no desenvolvimento da comunicação podem levar a uma intervenção precoce de especialistas para designar terapias adequadas e, por isso, é essencial a atenção aos sinais que indicam a necessidade de uma avaliação mais ampla em crianças com atrasos de linguagem.

"O médico otorrinolaringologista pode contribuir com o diagnóstico e tratamento desta população, auxiliando em uma melhor qualidade de vida e impactando positivamente na sua interação social, por ser uma das primeiras especialidades a ser procurada para o diagnóstico diferencial com à surdez. A população tem que estar atenta para não banalizar o atraso e deve buscar a intervenção precoce. Mesmo que o diagnóstico ainda não esteja completamente fechado, a criança já deve iniciar terapia", finaliza Trissia. *Orientações da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF) e da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica (ABOPe) - por Cidiana Pellegrin.

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