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"O Estado classicista e o racismo estrutural" por Gean Zandonadi e Claudinei Araújo

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Foto: Arquivo Pessoal

O ESTADO CLASSICISTA E O RACISMO ESTRUTURAL

Gean Zandonadi Lima Franco

Acadêmico do Décimo do Curso de Direito da FINAN.

Claudinei Araújo dos Santos

Docente do Curso de Direito FINAN

Em 2018 um levantamento feito pelo Perfil Sociodemográfico dos Magistrados, que foi elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontou características predominantes sobre o perfil dos juízes brasileiros, sendo homem, branco, cristão e casado, entrevistados 11,3 mil juízes, 62.5% do total em atuação. A pesquisa mostra que dos 80% declararam brancos. Os negros representam 54,9% da população brasileira e apenas 18,6% dos entrevistados no estudo eram considerados negros. A diferença na quantidade e posições que cada cor ocupa persiste até os dias atuais no país. Um total de oito em cada dez juízes no Brasil são brancos.

Os números atuais refletem uma realidade vivida por séculos no Brasil, a diferença de cor sempre notória e presente continua ser um grande inconveniente. Mesmo com o fim da colonia e o surgimento da república os ecos das relações sociais escravocrata ainda existem. Compunham cada vez mais o judiciário brasileiro os homens brancos, jovens e oriundos da classes média alta, que muitas vezes por uma oportunidade melhor serão quem define o futuro dos então réus que adversamente são compostos por maioria negra. A realidade de que os fatores decisivos nas decisões judiciais são compostos pela questão racial e social como o negro, pobre e sem estudo. A composição e a existência do ainda regime escravocrata refletidos no sistema judiciário revela importante constituinte do atual sistema penal.

Consequentemente a cor dos julgadores e dos julgados muitas vezes se opõem e o resultado é uma maioria branca no lado julgador e uma maioria negra no lado julgado. A ocupação de lugar definida pela cor acaba sendo visível, mesmo que não aceita, a criminalidade ganha cor e o reflexo da escravatura sobressai. Como se a definição do lugar de cada um na sociedade dependesse da raça e posição social. A culpa não começava uma vez reunida todas as provas: peça por peça, ela era constituída por cada um dos elementos que permitiam reconhecer um culpado. Assim, uma meia-prova não deixava inocente o suspeito enquanto não fosse completada: fazia dele um meio-culpado; o indício, apenas leve, de um crime grave, marcava alguém como “um pouco” criminoso. (FOUCAULT, 1987).

Um levantamento sobre condenados por tráfico apurou quatro mil sentenças em 2017 e que negros são os mais condenados e com menos drogas apreendidas. A maioria das apreensões é inferior a 100g e 84% dos processos tiveram testemunho exclusivo da polícia. O caso de Eliane que foi condenada por tráfico de drogas é um entre vários, enquaTdrada no artigo 33 da Lei de Drogas, pega com 1,4 gramas de maconha no cós da calça, ao visitar o filho que cumpria pena na Fundação Casa foi flagrada na revista íntima. Sem antecedentes criminais, ela confessou que estava levando para o menor, pois este estava ameaçado dentro da unidade. O juíz do caso condenou Eliane e afirmou que o regime fechado era a decisão necessária para a gravidade do crime. Eliane pôde responder em liberdade e foi condenada em onze meses e dez dias. (Domenici e Barcelos,2019)

Em São Paulo, por exemplo, são condenados mais negros do que brancos, sendo 71% dos negros julgados foram condenados e entre os brancos a frequência é de 67%. Outro dado importante é o de desclassificação de posse para droga para consumo pessoal, sendo de 5,3% entre os negros e 7,7% entre os brancos, os dados mostram uma criminalização maior dos negros. Também foi revelado que os negros são condenados com menores quantidades de maconha, cocaína e crack em relação aos brancos. No caso da maconha a diferença é absurda, sendo a média entre os condenados negros em 71% dos casos, em 145 gramas e com os brancos em 64% e a média em 1,14 quilos. Um grande exemplo foi o caso Mali, condenado em cinco anos por uma juíza com base em testemunho de dois policiais que alegaram “de longe em atitude suspeita”, um homem negro, sem antecedentes criminais e portando 1,6 gramas de cocaína. Sem haver parâmetros objetivos que diferenciem traficantes de usuários, prevalece o entendimento entre o triângulo formado por Ministério Público, policia e magistrados e então o julgamento fica definido na mão do poder. (Domenici e Barcelos, 2019).

Existe uma premissa racista e rasa presente nas condenações e que definem a construção criminal contra pessoas negras, o racismo presente principalmente em falas como “há mais negros do que brancos presos, por isso os negros são mais criminosos” infelizmente existem ainda e os dados comprovam que a criminalização dos negros quem define isso. As condenações baseadas em características raciais acabam criando um imaginário de que os crimes só são cometidos por negros.

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