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“Clima de guerra” por Elizeu Gonçalves Muchon

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Foto: Divulgação

Talvez eu seja um privilegiado, nunca vivi um clima de guerra. Meus contemporâneos brasileiros de minha geração gozam dos mesmos privilégios.

Nem por isso desconhecemos os horrores das guerras registrados em letras garrafais na história de humanidade.

Uma coisa, porém, é ler os livros, ou ouvir nos documentários de TV, outra é ser parte integrante do cenário de catástrofe.

Digo isso, porque os dias de quarentena para cumprir o protocolo de prevenção ao Coronavírus, (que estamos fazendo), é algo novo, é uma experiência estranha, envolta por um clima de tensão e extrema preocupação, diante dos noticiários que invadem as mídias em todo canto do mundo.

É uma experiência melancólica que a todo modo nos mostra quão vulnerável somos, por mais que nos achamos semi-deuses e dotados de autonomia.

O que se vê por toda parte da terra são mortos que deixam suas famílias. Marido, mulher, filhos, netos... Em alguns países são organizados filas nos crematórios. Uma tristeza imensurável.

Aqui no Brasil, em algumas capitais, está determinado que as salas de funerais não possam abrigar mais de dez pessoas por vez. Até mesmo as manifestações físicas de pesares e solidariedade foram vedadas, para evitar a contaminação.

No Brasil e no mundo, centenas se veem isolados em um canto de sala, cercado por coroas de flores, chorando seus mortos na melancolia de um último adeus.

É muito provável que este aprendiz de cronista esteja exagerando, pintando um cenário mais turvo do que a realidade, mas não posso tergiversar do que penso. Não posso, todavia, dizer que é a manifestação do apocalipse, pois na real sei que não é.

A propósito, é bom destacar que há muito tempo a Literatura conta o drama de ser prisioneiro da peste”. Escritores como Boccaccio – mais remotamente – e Alberto Camus – mais recentemente – descreveram dilemas morais e psicológicos das pestes (bem mais graves que o Coronavírus). Os temas comuns são as fugas das cidades e a tentativa de se livrar do confinamento. A quarentena em casa, no hospital, em campos de concentração, no bairro bloqueado pela barreira sanitária. Era o desejo de não ser um prisioneiro da peste, escreveu Alberto Camus.

Talvez fosse melhor falar do amor, da flor, ou da beleza dourada dos trigais. Talvez deixar claro que as coisas belas não estão perigando, sendo ameaçadas, sendo ofuscadas, no entanto, esse toque de recolher, esse silêncio das ruas ermas e desertas, dá a dimensão exata de que realmente tem algo de errado e perigoso vagando no espaço.

Então resta pensar na benevolência. Podemos ser benevolentes e solidários, afinal, nós brasileiros gostamos do aconchego, do convívio social, nesse instante privado, mas nossa solidariedade pode se manifestar ao tomar os cuidados para não contaminar nosso semelhante.

O país está parado e nossa economia será fundamentalmente atingida. Tempos difíceis virão pela frente. Minha preocupação, entretanto, é com as pessoas.

Por derradeiro, vamos fazer do limão uma limonada. Tirar lições e amadurecer como seres humanos, enquanto houver tempo, evidentemente.

Elizeu Gonçalves Muchon – Professor e Jornalista

elizeumuchon@hotmail.com

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